O ritmo acelerado de dezembro – com o agravante da internação de minha mãe há 15 dias – afastou-me do blog, o que gerou um acúmulo de fatos para serem registrados. Para começar, quero contar que tenho uma prima na cadeia. Isso mesmo, ela está presa e essa é uma situação estranha. Trata-se da filha adotada de um dos irmãos da minha mãe, Agostinho, já falecido. Quando ela ficou órfã (a mulher do meu tio, Zoraide, também morreu), eu e meus irmãos (Roberto e Flávio) continuamos a ajudar a moça, mandando uma quantia para garantir seus estudos. Até o dia em que soubemos que a grana estava sendo desviada para financiar seu vício, crack. Ainda mobilizados para ajudar, não desistimos e internamos a prima problemática em uma clínica de recuperação. Isso depois de presenciar seu estado deplorável – machucada na cabeça em função de uma queda na rua, magérrima, o olhar perdido, sem brilho.
Depois de várias fugas e mais de uma dúzia de mentiras, ela resolveu que estava curada. Continuamos colaborando, só que sem mandar dinheiro diretamente para ela, e sim por intermédio da dona de um mercadinho na cidade de Jacareí (onde a garota mora). Pela conta bancária da pequena comerciante, mandávamos a cesta básica de cada mês. Até que, por um telefonema do carcereiro da delegacia de Jacareí, soube que ela estava presa, ou melhor, está. Foi em cana porque estava em companhia de dois caras suspeitos, flagrados com uma pistola. Ela dançou. De lá pra cá, recebo suas cartas toda semana. Às vezes chega mais de uma. O papel ralo, barato, mas a letra redondinha, bem feita. Toda vez eu gelo, a respiração fica curta. Contrariando a opinião e orientação de muita gente, continuo enviando uma grana para a moça do supermercado levar cigarro, comida e produtos de higiene pessoal até a delegacia. Ontem pensei em escrever uma carta, rendendo-me às suas chantagens de que é a única presa que não recebe visita nem carta. Todas pedem alguma coisa. Nem decide responder, acabo de receber outra. Talvez me anime e crie coragem, ainda hoje, mais tarde. Vamos ver. Às vezes penso que, pelo menos no xadrez, não recebo a notícia de sua morte por overdose.
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Não dá para deixar passar batido o show de gravação do primeiro DVD da cantora baiana Vânia Abreu, no Teatro Bradesco, Shopping Bourbon, no final de novembro. Intérprete de timbre gostoso, repertório de qualidade e carisma no palco, Vânia mandou bem como marinheira de primeira viagem em gravação de DVD. Mesmo com as inevitáveis pausas durante o show, para a edição do filme, a plateia ficou até o final, pediu bis e ovacionou Vânia. A Arteplural tinha mais de 200 convidados, entre produtores, jornalistas e artistas, recepcionados por mim, pela Adriana Balsanelli e pelo Douglas Picchetti. O Metrópolis, da TV Cultura, fez link, isto é, entrou ao vivo com trechos da apresentação. Fomos ao camarim com a cantora Klébi, ganhei o novo CD. Enfim, foi uma noite muito feliz.
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Impagável o show do Chalalá é Chic, na festa de fim de ano da Arteplural, quinta, 3 de dezembro, no Miniteatro, sede dos amigos e clientes Marilia Toledo, Kleber Montanheiro, Veridiana Toledo e Cia da Revista. A princesinha da Praça Roosevelt presenciou cenas memoráveis e engraçadíssimas. Miriam Ramos, da Rádio USP, interpretou Chuva de Prata, a produtora e dramaturga Célia Forte cantou Caça e Caçador. As duas deram um show de desinibição. O momento interativo da noite também teve a participação da Lígia, do Douglas, da Carla (do DataFolha) e da Flávia. O quarteto mandou bala em Menina Veneno, e a atriz Maria Dressler e Luciene foram de Fogo e Paixão. Com o auxílio luxuoso da banda, capitaneada pela baixista e produtora musical Gigi Magno, que assina a idealização do projeto e a direção do projeto. Ao microfone, a cantora e MC Gigi Trujillo, com visual Amy Winehouse, segurou todas ao microfone.
Em noite de grande tempestade na cidade, passaram pelo Miniteatro os atores Melissa Vettore, Rachel Ripani, Joca Andreazza, Otávio Martins, o escritor Wladyr Nader, o dramaturgo e arquiteto Duílio Ferronato, a cantora Vânia Abreu e o músico Marcelo Quintanilha, a bailarina e amiga Renata e o iluminador Domingos Quintiliano (com o filho Lucas), minha cunhada Peha e meu irmão Flávio (ele de sandália Havaiana), o diretores Zé Henrique de Paula, o ator Sergio Mastropasqua e a turma do Núcleo Experimental e da Firma, os produtores Guete e Luque Daltrozo, o assessor de imprensa Tuca Notarnicola (da Gambiarra), os amigos Cleide Bardauil, Briba (da Universal Music), Marcello (da CM Express, serviço de motoboy), Beth Iozzi (da Support Contabilidade), Lica Keunecke, Rosana Rodrigues, Renata Pinheiro, Pricila, Teca, Rosa Virgínia e os atores da Cia Rodamoinho.
Outra noite feliz.
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Falando em Praça Roosevelt, era dezembro de 2000 e o grupo teatral vindo de Curitiba, mas que já tinha excursionado pela Europa e trabalhado muito por aí, preparava a inauguração do Espaço dos Satyros em São Paulo, na carcomida e mal tratada praça do centro da cidade de São Paulo. Para a estreia, a trupe vinha com o espetáculo “Retábulo da Avareza, Luxúria e Morte”. Deitada na cama, me recuperando da hepatite A que me tirou de combate por um mês, recebi o ator Ivam Cabral para acertarmos a assessoria de imprensa do lançamento do espetáculo e da abertura da sede própria. Começava ali a revitalização de um local da cidade, que depois veio abrigar outros grupos de artistas e suas companhias. Praticamente, Ivam e Rodolfo García Márquez foram os pioneiros.
Todo esse nariz de cera para comentar a tragédia ocorrida na madrugada de sexta para sábado, dias 4 e 5 de dezembro, no coração da Praça Roosevelt, exatamente no Espaço dos Parlapatões, quando o dramaturgo Mário Bortolotto – com quem trabalhei em Santidade, peça de José Vicente, com direção de Fauzi Arap, na década de 90, no Teatro Crowne Plaza – levou quatro tiros durante um assalto na sede dos Parlapa. Recebi a notícias pela internet. O primeiro pensamento: os fatos só viram notícia e saem no jornal quando as pessoas são baleadas e morrem. Porque todo dia tem neguinho desconhecido levando tiro por aí. A importância da Praça – que, mesmo sem segurança, é reduto de intelectuais, mendigos e as prostitutas que sobraram - e o nome do dramaturgo fizeram com que o fato fosse noticiado.
Fora a questão da classe artística – principalmente a teatral – estar consternada e torcendo pela melhora do Marião, precisamos pressionar o poder público para revitalizar a praça. O local era muito mais violento e perigosa antes dos artistas se instalarem lá. Foram exatamente os teatros, as sedes das companhias que se alojaram ali, que deram cara nova, vida nova ao local. A Roosevelt passou a ser freqüentada por artistas, jornalistas e intelectuais em geral. Antes do movimento teatral, a gente andava com medo por ali. Hoje é ponto de encontro.
O problema da violência é geral. Atinge desde as metrópoles, passando pelas capitais menores até as cidades do interior do Brasil. Você, leitor, sabe quantas pessoas são baleadas por dia/noite na cidade? Mas é triste precisar acontecer mais uma tragédia, entre milhares, para o poder público pensar em agilizar a reforma da praça, investindo em iluminação e infraestrutura.
Voltando ao crime nos Parlapatões, fecho com a Célia Forte, quando ela diz que o assaltante é um covarde. Está com a arma na mão, quando alguém peita, ele atira e sai correndo, sem levar nada. É covarde. Torcemos pela melhora do Mário.
Noite de muita aflição.
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Na decisão do Brasileirão, ponto para o Grêmio. Contra o Flamengo, perdeu por 2 a 1, lutou até os últimos segundos e valorizou com sua dignidade a conquista do título pelo Flamengo. Bem diferente do que fez o Corinthians no jogo contra o Flamengo na semana passada. Pelo menos minha mãe, carioca e rubro-negra, ficou contente.
Flores para Nair , que saiu do hospital. Noite mais calma.
(Fernanda Teixeira)