quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Re-forma gramatical da Lantejoula

Ângelo Madureira, Ana Catarina Vieira e companhia reapresentam a mais recente criação onde lantejoulas são definitivamente as protagonistas

Rafael Ventuna
Especial para Blog do Dudu

Para quem perdeu a estreia de “Mapa Movediço” na semana passada, a companhia de Ângelo Madureira e Ana Catarina Vieira reapresentam de hoje a domingo, no Teatro Cacilda Becker, uma curta temporada do espetáculo de dança contemporânea, que integra a programação das atividades comemorativas dos 10 anos da companhia. E para quem não acompanhou a trajetória da companhia ao longo desta década, fica a dica: lantejoulas dançam.
Quando no final da década de 1990 Ângelo e Ana Catarina se encontraram artisticamente, se propuseram a fundir o popular e o erudito; o nordestino e o sudestino; o feminino e o masculino; o côncavo e o convexo. É aí que entra uma nova linguagem, a linguagem da lantejoula.
O gramático Pasquale nos orienta que a linguagem está presente em todas as atividades comunicativas, sendo ela a capacidade de se comunicar por uma língua, que por sua vez é um sistema de signos convencionais. No caso, lantejoulas. Ângelo e Ana Catarina dialogam por meio de lantejoulas.
Começam por usar a forma mais popular “lantejoula” e abandonar “lentejoula”, como registram os dicionários. Usar “lente” não lhes parece necessário, porque a lantejoula para eles não é um instrumento-objeto; é sim um corpo irredutível, um radical, ao qual se acrescentam prefixos e sufixos. Com lantejoulas formam-se verbos, substantivos e adjetivos. Nomes e pronomes. Frases inteiras.
Diante disso, nos trabalhos anteriores da companhia há uma obsessiva sistematização do processo de criação, a exemplo de “O Nome Científico da Formiga” (2007) e “Baseado em Fatos Reais” (2010). Para chegar à coreo-grafia (escrita com movimentos), os intérpretes já se serviram de foto-grafias (escrita com luz) para propor uma sequência ordenada de imagens estáticas até chegar ao movimento. Ou seja, do fragmento ao todo. As lantejoulas operam no mesmo sistema: só se tornam um todo quando agrupadas, quando são penetradas por agulha e linha até formarem um bordado.
Percebe-se ainda na companhia um esforço em apresentar uma orto-grafia (escrita correta), talvez para justificar a já conquistada cali-grafia (escrita bela).
RE-FORMA
Em “Mapa Movediço”, a companhia mostrou-se ousada e corajosa. A começar pela honestidade de Juliana Augusta Vieira que propôs apenas uma luz geral no palco sem rotunda e coxias. Em cena, por mais paradoxal que seja, só se vê um processo de construção coreográfica desprovida de narrativa. Os semblantes dos bailarinos anulam a figura do intérprete e o figurino com calças de veludo deixam as lantejoulas livres para dançar. E como dançam as lantejoulas!
O trabalho ainda apresenta duas peculiares e importantes características. A primeira é a composição da trilha sonora que é feita em tempo real com microfones que captam o som das lantejoulas, passos, respiração. A segunda é oferecer ao público a oportunidade de ver dança para além do corpo humano, isto é, ver dança em um corpo-lantejoula.
O cenário também é construído a partir das formas e paisagens que surgem quando as lantejoulas dançam em sinergia com o movimento dos bailarinos, porém são as lantejoulas as protagonistas que dão forma (e re-forma) ao espetáculo e constituem a estrutura gramatical pela qual Ângelo Madureira, Ana Catarina Vieira e companhia articulam seu vocabulário.
MINIBIOGRAFIA
Rafael Ventuna é jornalista e crítico, com especialização em Economia e Gestão de Bens Culturais pela Fundação Getulio Vargas. É também pesquisador de Dança Contemporânea Brasileira.
 
foto Inês Correa

quarta-feira, 10 de outubro de 2012


(Para) Noia

Sinal vermelho, os carros freiam. Me meto entre um e outro na fila do meio do avenida. Chegou a hora.
- Passa a grana e o relógio! Tô com pressa, anda, te rasgo todo, faço um buraco fundo nessa tua careca ridícula! Merda, o cara acelerou, levou um baita susto, saiu cantando pneu e passou por cima de uma velhota manca. Ela atravessava fora da faixa, a vaca, deve ter merecido, aquele pescoço cheio de colares, anéis de ouro nos dedos. Deu pra ver o brilho. O estrago foi grande, sangue pra todo lado, começou a juntar gente. Tratei de correr, correr até ficar sem ar. Ufa, pronto.....O peito arfando, dez quarteirões depois escolho outra esquina, outro ponto estratégico.
Cara, preciso me dar bem... paciência é a melhor arma para mirar e dar o tiro certeiro no próximo otário com o vidro do carro aberto. Vai dançar o idiota! Quero ver o Zè Mané escapar. Tô ligadão..., esperto pra dar o bote. Me escondo atrás do ponto de ônibus, me espremendo pra ficar mais magro que sou, o estilete de 15 cm novinho em folha, preso entre a barriga e a calça. Dá pra sentir o gelado da lâmina de aço roçando os pelos da barriga, abaixo do umbigo. Esse bagulho que eu cheirei de manhã não bateu. Se liga, ninguém vai me ver, velho. Preto como a noite, vai ser mole.
Depois daquela zica, todo respingado de sangue, que nojo! Será que a vaca morreu...ponto de interrogação). Deve ser horrível sentir o tranco da lataria do carro bater no corpo...Uma geleia, monte de ketchup esparramado no asfalto. Opa, carro de vidro claro, mulher ao volante, vítima perfeita.
_ Vai logo, Madame, quero a grana e o celular  senão corto seu pescoço da garganta até o peito, vai!
Filha da puta, abriu a porra da porta na minha cara! A força do impacto me derrubou, caí de costa. A mulher soltou o cinto, desceu do carro, vestido preto curto, loiraça. Ainda deu pra ver os olhos verdes faiscantes de raiva, e as pernas gostosas, roliças, antes da vagaba enterrar o salto fino do sapato no canto da minha boca. Rasgou tudo, de novo o sangue  jorrando, aquele azedo descendo grosso pela garganta. Piranha, essa eu pegava.
(exercitando o narrador vil, Oficina de Escrita Criativa, com Nanete Neves)

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Irene, meu segundo furacão


Uma semana depois do forte tremor de terra sentido em Nova York, o furacão Irene estava para chegar. Nossa primeira vez na cidade reservava mais surpresas do que gostaríamos. Ser testemunhas e protagonistas do fato histórico causava expectativa e medo. Pelas ruas molhadas, guarda-chuvas comprados em camelô da esquina, eu, Sandra, Maria, Lydia e Anny resolvemos dar uma volta, comprar algo para comer mais tarde, quando estaríamos presas no quarto de hotel.

Enquanto caminhava pela Quinta Avenida lembrei do bilhete deixado naquela manha em cima da escrivaninha do hotel. Dicas de como agir, espécie de manual de sobrevivência. Era para ficarmos recolhidos, evitar o uso do elevador e, em caso de medo, poderíamos nos agrupar na recepção. Lanterninhas de led para todos os hóspedes, para uso nas escadas. Ordem para estocar água, alimentos e ....ufa, eles prometiam fazer de tudo para nossa segurança.
 
O vento aumentava de velocidade na mesma medida em que a temperatura do ar diminuía e o tempo piorava. Escurecia rapidamente. As entradas de acesso às estações de Metrô fecharam pela primeira vez na vida de Nova York. Ônibus também não circulavam. O Central Park exiba faixas com os dizeres closed. Sensação estranha, boca seca, mãos frias.

"Vão para casa agora e fiquem por lá tranqüilos até tudo passar", orientava o segurança da loja da Apple, normalmente aberta 24 horas, mas que fecharia as portas em breve. Respiração alterada, fotografo imensas nuvens negras acima de minha cabeça. Continuamos andamos pelas ruas assustadoramente vazias.
 
Na farmácia, fila para pagar. Xampu, escova e pasta de dente, o necessário para dormirmos, eu e Sandra, no hotel das nossas amigas. Difícil pegar táxi. Quando conseguimos, taxímetro desligado, o motorista cobrou preço fechado. Sempre alguém leva vantagem em circunstâncias assim, pensei, impressionada com o organização e rapidez dos americanos, pois a lista de preços das corridas ja estava impressa e plastificada, pendurada nas costas do banco do carona.

Do quarto do hotel, gastei bom tempo na janela observando a falta de movimento na rua. Sem o barulho constante das sirenes, só a fumaça branca saída dos bueiros continuava lá. Na TV, o assunto era só um: Irene. O prefeito ordenava evacuações em áreas de risco. Reportagens mostravam a população se preparando para enfrentar o pior. E nós, no no 15.andar de um edifício envidraçado, vulneráveis à aventura de dividir Manhattan com um furacão.
 
Entre ansiosas e receosas por estar ali e acompanhar situação sem precedentes nas nossas vidas, atendemos telefonemas da família em busca de notícias. Reunidas no quarto da Maria e da Lydia, relaxamos e bebemos a noite inteira várias garrafas de um vinho delicioso – o Copolla, comprado no lugar da água -, enquanto acompanhávamos pela TV a transformação do furacão em uma mansinha tempestade tropical. Confesso, fiquei com uma pontinha de decepção. Talvez mais aventura... .

Em tempo: este não foi o primeiro furacão da minha vida. O nome dele era George, cujos estragos vimos em Key West, na Flórida, mas essa história fica para outra crônica.

(Maria Fernanda Teixeira)

terça-feira, 4 de setembro de 2012

O dia em que desapareci

Situação inusitada aconteceu comigo em 2011. Viajei com um amigo para Punta del Leste, no final do ano, sem me preocupar com a documentação. Carteira de identidade vencida, embarquei com o passaporte. Na volta, preocupei-me em ir ao Poupatempo da Praça da Sé tirar o novo RG, o velho tinha mais de 10 anos. Fiz foto, juntei a papelada exigida e, no dia marcado, fui buscá-lo. Como havia mudado de casa, iria também ao Detran, para trocar o endereço do documento do carro.

- Deu problema, decretou a atendente, sem esboçar expressão alguma, cara de quem detém o comando da situação.

- Vai ver que foi com a documentação, continuou a moça. Depois de pegar senha e esperar até a semana seguinte, voltei ao Poupatempo e um rapaz repetiu a informação:

- Deu problema, consta que a senhora é desaparecida, precisa ir no DHPP.

Polícia Federal, pensei. Departamento de Homicídios e Proteçāo à Pessoa. Gelei. Respiração curta, decidi passar antes em casa para pegar um documento original, na certa eles pediriam. Para quem é da minha geração, viveu de perto os tempos difíceis da Ditadura, os amigos torturados, o medo no ar, ir à Polícia não era exatamente um programa. Tinha um gosto amargo.

No caminho, um mundo passou pela minha cabeça. Lembrei dos cartazes na padaria perto de casa, anos 70, ao lado de pôsteres da seleção de futebol campeã do mundo, cartazes com fotos dos chamados subversivos, o jornalista Daniel Aarão Reis, meu primo, entre eles, todos seqüestradores do embaixador alemão. Eu, mãos dadas com minha mãe, evitava até olhar para os procurados.
Quando cheguei em casa, elevador quebrado, subi 9 andares a pé. Da mesma forma, encarei as escadas para chegar à rua. Tomei um ônibus, a respiração ainda ofegante, desci no bairro da Luz, onde fica a Polícia Federal. As mãos frias, boca seca, um arrepio de pânico ao imaginar que teria de encarar meus fantasmas e entrar no prédio.

- Coragem, vamos!, falei para mim mesma, tentando convencer minhas pernas a se movimentarem. Entrei no elevador, parei no andar indicado. Clima sinistro, deserto. Depois de atravessar o imenso hall vazio, reparei numa moça lixando as unhas. No trajeto até a sala onde teria de ir, cruzei com pessoas desocupadas, xícaras de café nas mãos, jogando conversa fora. Continuei a andar até que me deparei com a placa Pessoas Desaparecidas no alto da porta de uma sala. No fundo, um rapaz de cabelo rastafari acenou com um gesto para que eu aguardasse. Era como se eu precisasse esperar a minha vez na fila.

Quando, enfim, ele me chamou, segundos pareciam uma eternidade enquanto digitava, os olhos fixos na tela do velho e empoeirado computador, e voltava, sem emitir som algum, a me encarar. A cena, para meu desespero, repetiu-se algumas vezes.

- O que você estava fazendo em 1998?, disparou, rápido como uma metralhadora.
Antes mesmo que conseguisse responder, a respiração presa depois do susto, ele engatou, ar de desaprovação:

- Porque consta queixa de desaparecimento seu. A sra viajou?

Atônita pelo inusitado da situação, puxei pela memória, viajo bastante, mas deu branco na hora. Nervosa, não conseguia lembrar nem onde estivera ontem.

- Vai ver estava me escondendo de algum namorado, brinquei, tentando relaxar.
O homem voltou-se para a tela do computador e continuou a digitar, olhar para mim, digitar, aquele som irritante ecoando em meus ouvidos.
- Descobri, disse, o volume da voz levemente alterado. Tem um cara com o mesmo RG da senhora, mas sem o dígito.
Respirei aliviada enquanto o homem explicava que uma confusão deveria ter ocorrido no sistema para que fossem registrados dois números iguais e constasse meu desaparecimento.

- Já resolvi o problema, disparou, para logo em seguida, pensativo, emendar uma pergunta:

- Em 2005 a senhora perdeu o documento, confere?
- É fui furtada há alguns anos.
- Pronto, está tudo bem. Pode voltar ao Poupatempo que já tirei do sistema a informação incorreta. Seus namorados agora vão poder achar a senhora, disse, um sorriso irônico.

As unhas roídas, senti uma gota de sangue brotar na cutícula machucada. Sem dar atenção à dor no dedo, deixei o prédio imediatamente. Peguei o Metrô na Luz, saí na Sé, de volta ao Poupatempo, de onde fui embora com o novo RG.
(Maria Fernanda Teixeira)

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Aventura e medo na lancha

“Para que santo devo rezar em situações como esta?”, pergunto para minha amiga Sandra, tentando manter a calma e o ritmo da respiração. “Não sei, para qualquer um.” Antes de esconder a cabeça no interior da capa de nylon azul, distribuída aos passageiros pelo marinheiro no começo da viagem, que só fui entender depois sua utilidade, nova enxurrada varre a lancha.
 
A tarde de sol quente não era garantia alguma de que estaríamos livres de um sufoco no mar do Caribe colombiano. A chuva do dia anterior tinha deixado o mar muito bravo. Ouço o motor diminuir, sinal da aproximação de mais uma daquelas ondas enormes. “Quantos metros teria?”, tento calcular para me distrair. Cerro os dedos para me segurar firme no apoio em frente à poltrona, uma queda no mar seria o caos. Fecho os olhos, prefiro não ver.  “Ave Maria cheia de graça....”, emendo uma oração na outra como um mantra, repetindo, repetindo pro tempo mais rápido.
 
A viagem de volta da Ilha de San Pedro de Majagua (no arquipélago San Rosario) para a cidade de Cartagena, na Colômbia, estava se configurando uma aventura inesquecível. Sentadas nos bancos de trás, nossas companheiras de viagem Renata e Rosa riam muito. De nervoso. Quando a lancha atracou, todas molhadas, tivemos de trocar de roupa no banheiro da marina. Em uma hora embarcaríamos rumo a Bogotá. Nunca fiquei tão animada com a perspectiva de pegar um avião.
 
(Fernanda Teixeira)

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Camarote Solidário 10 anos

Texto Fernanda Teixeira

Fotos Adriana Balsanelli



Era uma tarde de sábado de 1990 quando a pedagoga, também formada em Serviço Social, Maria Luiza Augusto Martins foi medida dos pés à cabeça ao entrar no sobrado de número 770 da rua Major Diogo, na Bela Vista. “Aceita um café?” A dona da casa, Brenda Lee (nascida Cícero Caetano Leonardo em 1948, em Pernambuco, e assassinada em 1996, em São Paulo), e sua amiga Edna (travesti, figura folclórica do Largo do Arouche), se entreolhavam e a visita entender estar sendo analisada. “Você foi aprovada porque tomou cafezinho na nossa xícara.”


Hoje diretora presidente da Casa de Apoio Brenda Lee (desde 2006), naquele momento a paulista da Mooca Maria Luiza estava sendo aceita como voluntária pela militante transexual dos direitos dos homossexuais, conhecida inicialmente por Caetana e que chegou a São Paulo aos 14 anos, tornado-se figura festejada do bairro do Bixiga.


“Brenda era alegre, divertida, andava com um salto alto enorme, usava sempre tailleurs, grandes brincos e preferia frasqueiras a bolsas. Tinha duas covinhas lindas, uma mulher sem papas na língua, devota de Nossa Senhora Aparecida, que investiu tudo nesta casa”, conta Maria Luiza, sorridente, dizendo ter tido a felicidade de conviver com Brenda Lee por seis anos. Maria Luiza ficou encantada quando esteve na casa pela primeira vez: “Eram hilariantes as figuras que aqui estavam”.


Pintada de cor salmão, vizinha do cabeleireiro Maison Hair, da lanchonete Raro Sabor, de uma sapataria e uma oficina mecânica, a Casa de Apoio Brenda Lee foi oficialmente regulamentada em 1992, quando recebeu CNPJ. É reconhecida como de utilidade público nos âmbitos municipal, estadual e federal, e está inscrita no Conselho Municipal de Assistência Social.


É mantida em parte pelo Ministério da Saúde, que repassa verba para o Município, que por sua vez repassa às Casas de Apoio Tipo 1, responsáveis por cuidar de pessoas necessitadas, garantir sua reinserção social e adesão ao tratamento das doenças – Aids, Hepatite e outras sexualmente transmissíveis.


De acordo com Maria Luiza, 90% das pessoas que chegam à casa estão em situação de rua, sem documentos. Os hospitais que possuem serviço de infectologia (Emílio Ribas, Incor etc) nos encaminham as pessoas “Providenciamos o processo de resgate da cidadania, tirando todos os documentos, até certificado de reservista. A casa arca com despesas de condução (“para eles não perderem as consultas”) até chegar o bilhete único. Dependendo do histórico da doença, a LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) concede aos HIV + o benefício de um salário mínimo.


Gabriela (Luiz Gonzaga de Amarin Júnior) é um dos casos de reintegração. Depois de morar 2 anos na casa, vindo do Hospital Saboia, onde se tratava de tuberculose, atualmente é responsável por cuidar do brechó, que funciona em espaço na frente da casa. “Ela é uma vencedora, hoje aluga um quartinho no bairro”, orgulha-se Maria Luiza, completando: “Era dependente de álcool e drogas e agora veste a camisa da casa”.

 
Com poucos sócios mantenedores, a casa valoriza seu brechó, que aceita roupas, sapatos e até eletrodomésticos, tudo em bom estado – seu funcionamento é das 8 às 11h e das 12 às 16 horas. Também são realizados eventos com renda revertida para a Casa Brenda Lee, como o musical Berlioz de canto lírico e evento da boate Blue Space, em parceria com Nany People, Salete Campari e Silvete Montilla, ambos realizados anualmente.


Iniciativa pioneira em São Paulo, a Casa de Apoio Brenda Lee foi ainda a primeira que recebeu mantimentos do Camarote Solidário, realizado pela jornalista Roseli Tardelli, Editora Executiva da Agência de Notícias da Aids. Anualmente, a Agência promove uma confraternização de Natal com os pacientes. O restaurante Rubayat cede a ceia e todos almoçam juntos, com música, show de drags.


Travestis, homossexuais e homens, na maioria, formam o público que pede acolhimento na Casa Brenda Lee. Aretha é um destes moradores. Vinda de São José do Rio Preto, está em tratamento de Hepatite na casa desde janeiro deste ano. “Quarentona, minha meta é ficar aqui até o final do ano”, conta, comunicativa (“vai ter foto?”), blusinha regata, cabelos alisados, os olhos negros redondos. André Fernandes Nunes na carteira de identidade, a taurina de 18 de maio, que adora dance music (“mas não desfaço de um forró ou axé”), faz o seu lazer. “Dou umas voltinhas, gosto de ir na igreja e adoro andar de metrô,pra lá e pra cá.”

Sobre Brenda Lee

Brenda Lee comprou a casa na Rua Major Diogo, 779 e acolheu o primeiro portador do vírus HIV em 1984, numa época de desinformação e preconceito, quando até os familiares rejeitavam quem tinha Aids. Naqueles tempos não havia infraestrutura para acolher quem recebia alta hospitalar e não tinha onde morar. A Casa de Apoio Brenda Lee, também conhecida como Palácio das Princesas, foi instituída formalmente em 1988 para abrigar homossexuais e portadores de HIV rejeitados por parentes e também com o objetivo de dar assistência médica, social, moral e material, fossem eles travestir ou não.


No dia 28 de maio de 1996 Brenda foi brutalmente assassinada com um tiro na boca e outro no peito e seu corpo foi encontrado mais tarde dentro de uma Kombi em um terreno baldio.Sua missa de corpo presente — realizada pelo padre Júlio Lancellotti, representando o cardeal Dom Paulo Evaristo Arns — foi rezada na sede da casa de apoio. Brenda era considerada o “anjo da guarda dos travestis” e tinha como objetivo ajudar a todos, doentes ou não, que eram discriminados pela sociedade.


O trabalho de Brenda tornou um referencial e um marco importante. Em 21 de outubro de 1988 foi instituído o prêmio Brenda Lee concedido quinquenalmente para sete categorias por ocasião das comemorações do Dia Mundial de Combate à Aids e aniversário do Programa Estadual DST/Aids do Estado de São Paulo.

 
Casa de Apoio Breenda Lee – 11. 3112-1384. Rua Major Diogo, 779, Bela Vista, CEP 01324001 SPaulo/ Capital. casabrendalee@gmail.com



Ideal vivo e preservado

Matéria da Revista
Camarote Solidário
por fernanda teixeira
e adriana balsanelli




Comédia Serpente Verde, Sabor Maçã

Vestida de vermelho sangue, a compulsiva, misteriosa e enigmática Senhora G oferece xícaras de chá para suas visitas, ora do bule prateado, ora do bule dourado. Dependendo de seu julgamento sobre se o convidado é torpe ou possui boa índole, o resultado do encontro pode ser amargo e fatal. A cada chá servido, uma nova sentença decretada por esta terrível mulher, interpretada por Lulu Pavarin. Esta é a trama de Serpente Verde, Sabor Maçã. O espetáculo volta em cartaz no Espaço Parlapatões para uma curta temporada às quintas e sextas-feiras, às 21h, a partir de 2 de agosto (para convidados) e 3 de agosto (para público). Até 31 de agosto.
 

Fábula dark, a peça tem texto que brinca com gêneros - pode ser drama, comédia, comédia dramática, humor negro - dos cariocas Jô Bilac e Larissa Câmara, produção da Casa 5, do titã Branco Mello e da atriz Angela Figueiredo que é integrante da recém-formada Cia das Trevas formada também por  Lavínia Pannunzio, Luna Martinelli e Fernando Fecchio.
 

Em cena, os simpáticos e inesperados personagens conduzem a trama desta comédia de forma divertida, tornando a plateia cúmplice da agradável senhora e seu bule de chá. Em clima de suspense, a graça se revela atraente, por meio da penumbra do carrinho de chá verde, sabor maçã. Com acidez, o espetáculo levanta questões entre o bem e o mal. Falando sobre moral com humor, personagens em crise e sem pudor. O tom do espetáculo é dado pela forte interação do elenco muito intenso e afinado.


O espetáculo fez temporada em São Paulo no ano passado e foi convidado para o projeto SESI Viagens Teatrais 2012, onde se apresentou em 17 cidades do Interior, com “casa lotada em todas as apresentações e retorno muito positivo das plateias que riram muito, vibraram e aplaudiram em cena aberta”, segundo a produtora e atriz Angela Figueiredo. Nesta nova temporada, a produção da peça libera o público para fazer registros do espetáculo. Iniciativa de Angela Figueiredo, a ideia é que as pessoas postem fotos e vídeos em redes sociais, ajudando na divulgação. “Além de estimular os atores, é mais uma forma das pessoas saberem que estamos em cartaz”, explica a produtora e atriz.


Elenco e personagens

Na trama, Lulu Pavarin vive a Senhora G. “Ela decide quem vive, quem é bom ou mau. O G de seu nome vem de God. Ela se declara uma mentirosa compulsiva, o que é rico para uma atriz", conta Lulu.


Angela Figueiredo, Luna Martinelli e Fernando Fecchio se desdobram em nove personagens, que entram e saem de cena.

Mulher objetiva às voltas com a problemática inquilina que não desocupa sua casa, a Senhora White e interpretada por Angela Figueiredo. Assim, ela contrata um detetive para saber o segredo da Senhora G, que acaba se apaixonando pelo homem e abrindo a guarda", conta a atriz, que também interpreta Evelyn, outra personagem da trama.


"Vizinha da Senhora G, mãe de um garoto que sem querer joga sua bola na casa ao lado, e por infortúnio do destino os dois acabam invadindo a privacidade da simpática vizinha". Atualmente, Angela Figueiredo está na produção do documentário sobre os 20 anos do grupo Parlapatões, entre outros projetos. 


Luna Martinelli faz duas personagens, as irmãs gêmeas Fox e Flávia, que vivem competindo e se envolvem com o mesmo homem, atual noivo de uma delas. Na opinião da atriz, trata-se de uma peça "capaz de fazer a plateia rir dos absurdos cometidos pela personagem Sra. G, que acredita ter o papel de ceifadora da humanidade, preservando os bons e eliminando os maus". Atualmente, a atriz também está em cartaz com Limpe Todo o Sangue Antes que Manche o Carpete, também de Jô Bilac, que lhe rendeu o prêmio do Festival Festkaos de melhor atriz. 


O ator Fernando Fecchio conta que seus personagens – os masculinos - têm a possibilidade de transitar por figuras muito inusitadas e divertidas. "Os rapazes são os tipos mais sortidos possível. Tem o detetive canastra, que se passa por bom moço para conquistar e passar ileso pela perspicácia da protagonista, o jovem hipocondríaco blasé e mesquinho e uma criança terrorista que leva a Sra. G a cometer uma atrocidade causando a revolta do Bule e das Xícaras.”

Proposta de encenação

Serpente Verde, Sabor Maçã segue os passos que o cinema trilhou em filmes como Este Mundo é dos Loucos, de Philippe de Broca; Sunset Boulevard, de Billy Wilder; Cidade dos Sonhos, de David Lynch; Este Mundo é um Hospício, dirigido por Frank Capra, baseado na peça Arsênico e Alfazema, de Joseph Kesselring; O que Teria Acontecido a Babe Jane?,  de Robert Aldrich.


Convidada para dirigir a montagem, Lavínia se encantou com o projeto. "Adorei o texto. A Senhora G tem um grande carisma e comete atrocidades. É como se as nossas convicções caíssem por água abaixo, uma pessoa que decide o que é bom e ruim para os outros. A peça é uma fábula com caráter lúdico, uma colagem com influências do cinema e da música. O cenário brinca com essa questão de verdade e mentira, tem rosas sintéticas, a prata, que é a cor da morte, está presente. Já os figurinos ilustram esses personagens, expressam algo da natureza humana", explica Lavínia.


Paralelo à direção de Serpente Verde, Sabor Maçã, Lavínia Pannunzio estará no elenco da peça Um Verão Familiar, de João Fábio Cabral, dirigida por Eric Lenat, ao lado de Ed Moraes, João Bourbonnais e Renata Guida.



PARA ROTEIRO

Serpente Verde, Sabor Maçã - Reestreia dia 2 de agosto, quinta-feira, às 21h- Texto - Jô Bilac e Larissa Câmara. Direção - Lavínia Pannunzio. Elenco - Lulu Pavarin, Angela Figueiredo, Luna Martinelli e Fernando Fecchio. Cenário - Cássio Brasil. Luz - Aline Santini. Figurinos - Daniel Infantini. Trilha Sonora - Branco Mello. . Pesquisa Musical – Bento Mello. Coreografia - Lara Pinheiro. Programação Visual - Zootz Comunicação. Realização - CASA 5 e Cia das Trevas. Temporada - Quintas e sextas-feiras às 21 horas.  Ingressos - R$15,00 e R$30,00. Duração -  70min Censura - 14 anos. Até 31 de agosto.

ESPAÇO PARLAPATÕES – Praça Franklin Roosevelt, 158 – Centro. Informações – (11) 3258.4449. Capacidade – 98 lugares. Aceita cartões de crédito e débito. Acesso para portadores de necessidades especiais. Estacionamento conveniado na Rua Nestor Pestana, 129. Bilheteria – De terça a domingo, das 16h às 22h. Ingressos por telefone – Ingresso Rápido – (11) 4003 1212 ou pelo site www.ingressorapido.com.br

Niklasstrasse, 36


Processo colaborativo da Cia. dos Imaginários foi elaborado a partir da obra A Metamorfose, de Franz Kafka. A trama narra o caso de um homem que acorda transformado num gigantesco inseto e presencia um mundo repleto de
perversidade das relações familiares, das estruturas de dominação,
além da alienação humana

Baseado na obra A Metamorfose, de Franz Kafka, a Cia dos Imaginários volta com a peça Niklasstrasse, 36, dia 4 de fevereiro, sábado, às 21 horas, no Teatro Commune. A trama tem a direção de René Piazentin, responsável também pela adaptação do texto e direção de arte. Em cena, os personagens vividos pelos atores Aline Baba, Camila Nardoni, Luana Frez, Lucas Pinheiro e Mariana Viana revezam-se no papel de narradores da história.
“Uma nova temporada é sempre uma oportunidade para revisitar o próprio trabalho, especialmente quando ela não ocorre logo em seguida à primeira. É uma chance não só de levar a público novamente o trabalho, mas de olhá-lo com outro frescor. Como a temporada no Teatro Cacilda Becker foi curta, muitos nos perguntaram sobre a peça, achando que ela ainda estava em cartaz e acabaram perdendo a oportunidade de assistir. Esperamos que agora mais pessoas possam conhecer Niklasstrasse, 36", diz o diretor.

A montagem mostra uma manhã que deveria ser como outra qualquer, mas que marca, definitivamente, a vida de Gregor Samsa. A metamorfose já aconteceu. O que o espectador vê, ao longo da fábula kafkiana, é a transformação do entorno, das pessoas que convivem com Gregor - a clareza cada vez mais nítida sobre a perversidade das relações familiares, das estruturas de dominação, além da alienação humana.

Utilizando as palavras do texto de Kafka e trechos de comentários retirados de análises e traduções diversas sobre o autor, René criou uma encenação que traz o olhar de quem percebe a metamorfose e reage a partir dela.

O espaço cênico é alterado pela dinâmica do uso de objetos, em especial por malas em diversos tamanhos que guardam em seu interior elementos figurativos. As malas fazem referência à profissão de Gregor - caixeiro viajante. “O recurso essencial é o jogo de recodificação, sem a tentativa de uma perspectiva ilusionista”, comenta a atriz Mariana Viana sobre a direção de arte da peça. Para o figurino, René optou pelo simples. “Pequenas mudanças na indumentária dão suporte às mudanças de personagens.”

Para fazer a adaptação do livro A Metamorfose a equipe buscou seguir a linha da fábula original, mas sem passar por uma etapa de escrita de uma dramaturgia. René propôs que trechos do conto fossem improvisados diretamente pelos atores. Ele selecionou fragmentos que interessavam à narrativa, para aos poucos serem transformados em um roteiro. “A tentativa é ressaltar a metamorfose de Gregor pelo seu entorno - através do que acontece com as figuras exteriores à sua transformação - mais que na caracterização da figura central”, comenta o diretor.
“Encenar Kafka é um desafio, em especial no que diz respeito ao risco de se cair em alguns lugares comuns, como uma atmosfera lúgubre ou depressiva. Sem negar os elementos de densidade que estão presentes na essência da obra kafkiana, a proposta valoriza a ironia que emana do texto, em especial pela não adaptação do conto em uma estrutura de diálogos, mas no desmembramento da narrativa em vozes múltiplas que conduzem a fábula”, enfatiza René Piazzentin.

Sobre Kafka
Franz Kafka nasceu em Praga, no dia 3 de julho de 1883, filho de um rico comerciante judeu. A relação com o pai, com as diferentes estruturas de poder e um sentimento de espanto com a falta de sentido da existência humana são uma constante em sua obra, influenciada por três culturas: a judia, a tcheca e a alemã. Formou-se em direito, nunca se casou, foi funcionário de uma companhia de seguros. Durante toda sua vida teve uma saúde extremamente frágil e jamais conseguiu fama com seus livros.

Pouco antes de sua morte, em 3 de junho de 1924, em um sanatório para tuberculosos perto de Viena, pediu a seu amigo Max Brod que queimasse seus manuscritos. Graças à “traição” do amigo, hoje conhecemos obras como “O Castelo”, “O Foguista” (que é na verdade o primeiro capítulo de “América”), “A Sentença” e “O Artista da Fome”. “A Metamorfose”, seu conto mais conhecido, foi escrito em 1912, quando o autor tinha 29 anos. Na história, um homem acorda transformado em um “inseto monstruoso”, sem que haja qualquer explicação sobre como ou porque isso acontece. Através desta situação fantástica, Kafka dá seu testemunho de desespero frente ao absurdo e à opressão do mundo.

Sobre a Cia dos Imáginários
A Cia. dos Imaginários formou-se em 2006, a partir do encontro do diretor René Piazentin com atores que desejavam iniciar uma trajetória profissional vinculada à pesquisa e estruturação de uma linguagem cênica que valorizasse mais a construção de imagens e símbolos que o aspecto verbal. No repertório da companhia: Hamlet- Zero (adaptado de Shakespeare), As Troianas (Sartre), Quixote (Cervantes), Sonata dos Espectros (Strindberg).

Serviço:
Niklasstrasse, 36 – Reestreia dia 4 de fevereiro, sábado, às 21 horas, no Teatro Commune. Com a Cia. dos Imaginários. Processo Colaborativo a partir da obra A Metamorfose, de Franz Kafka. Elenco: Aline Baba, Camila Nardoni, Luana Frez, Lucas Almeida e Mariana Viana. Gênero: drama. Duração: 60 minutos. Classificação: 16 anos. Direção e adaptação: René Piazentin. Assistente de Direção: Carolina Loureiro. Coordenação do Projeto: Aline Baba. Preparação de Ator: Paulo Renato Panzeri. Iluminação, cenário e figurino: René Piazentin. Maquiagem: Carolina Costa. Produção: Núcleo Imaginário de Produção. Projeto gráfico: Mariana Viana. Fotografia: Mariana Noguera.
Teatro Commune - Rua da Consolação, 1.218. Telefone: (11) 3476-0792. Reestreia: dia 04 de fevereiro. Temporada: Sábados às 21 horas e domingos às 20 horas. Ingressos: R$ 20,00 e 10,00 (meia). Lotação: 86 lugares. Até 26 de fevereiro.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Mormaço no Núcleo Experimental



Um diretor montando a segunda estreia do ano em seu novo espaço – a primeira foi Bichado. Um texto de um jovem e inédito dramaturgo brasileiro. Atores com diferentes trajetórias profissionais, oriundos de diferentes experiências na cena paulistana. Combinação de fatores importantes, MORMAÇO, a novidade teatral do pessoal do Núcleo Experimental, entra em cartaz dia 9 para uma curta temporada até 29 de agosto.
A exemplo da montagem de O Livro dos Monstros Guardados, de Rafael Primot, em 2009, o diretor Zé Henrique de Paula aposta na nova dramaturgia brasileira e leva aos palcos o texto de autoria do jovem Ricardo Inhan, formado pelo Núcleo de Dramaturgia do Sesi / British Council. Recentemente, Inhan foi um dos roteiristas da versão brasileira da série In Treatment, dirigida por Selton Mello.
Para Zé Henrique, Mormaço se comunica, de alguma forma, com as peças da Trilogia da Guerra (As Troianas – Vozes da Guerra, Casa/Cabul e Bichado), ao abordar temas como violência, poder e desesperança.
Mormaço narra histórias de jovens sem ambição, devastados pelo isolamento e pela solidão. O enredo se desenvolve por meio de três quadros: dois amigos punks que são agredidos por um grupo de skinheads numa manhã ensolarada de domingo; dois irmãos presos em casa que planejam a morte do pai; e dois amigos, numa pista de skate, que saem com a mesma garota e aguardam o mormaço passar. Veja o site do grupo www.nucleoexperimental.com.br
Poder de comunicação
Zé Henrique conheceu o autor Ricardo Inhan em 2010, quando leu as peças produzidas no Núcleo de Dramaturgia do SESI/British Council, segunda turma. “Das doze peças que eu li naquele ano, a do Inhan me chamou a atenção pela escrita de alto poder de comunicação, aliando sofisticação dramatúrgica, inventividade formal e aquilo que eu busco em qualquer texto teatral, um olhar humano sobre os personagens”, diz o diretor.
Começou uma correspondência entre os dois e Ricardo foi mandando para Zé seus outros textos. Mormaço foi desenvolvido durante esse período, em parceria com integrantes do Núcleo Experimental que haviam trabalhado como assistentes de direção. “Com a peça mais amadurecida, acabei achando que ela já podia ser trabalhada com um grupo de atores e vir à cena”, fala Zé Henrique.
Sobre a montagem da peça, o encenador conta que ele e o grupo passaram mais da metade do processo debruçados sobre o estudo do texto, dos temas abordados, da gênese dos personagens e dos elementos visuais que inspiram a encenação (arte de rua, grafite, o registro fotográfico dos movimentos punk e skinhead, além de obras de pintores como Schiele, Rebolo e Munch).
“Como sempre, tenho privilegiado o trabalho dos atores, a ideia de descobrir e investigar a peça com os atores na sala de ensaio, o teatro como processo mais do que resultado. Claro que prezo pelo acabamento visual e musical - desta vez, a parceria em música se dá com o músico Hélio Flanders, vocalista da banda Vanguart”, diz Zé Henrique.
É a segunda peça que o grupo ensaia inteiramente no Teatro do Núcleo Experimental. Para o diretor, “esse fato, sem dúvida, acrescenta um outro elemento à concepção de direção, que é a interação com o nosso espaço cênico, a possibilidade de descobrirmos a concretude, a materialidade da peça, no próprio espaço em que ela será encenada”.
 Desta vez, Zé Henrique de Paula usará o espaço aberto, as perspectivas, as longas distâncias, a ocupação dos cantos e dos vãos da sala, criando o ambiente inóspito e sufocante que Ricardo Inhan sugere para as três cenas da peça.
Texto potente
Para Ricardo Inhan, o texto de Mormaço não respeita a ideia de trama. “Não é uma obra que permite uma aproximação com um enredo feito para dar sentido nas ações e criar emoções de identificação no espectador”, explica. O texto foi escrito para mostrar (e não discutir) as circunstâncias que levam determinadas ações de violência a lugares extremos.
“É um mosaico sobre desesperança e desamparo. Ao mesmo tempo em que não permite uma interpretação imediata, uma única visão de mundo. Acho que pode ser um texto potente, por operar por outras formas de subjetivação e não focar em construções de personagens, mas por rascunhos de personalidades.”

Para o autor, Zé Henrique é um diretor de escolhas dramatúrgicas interessantes, corajosas. “O impacto da primeira vez que vi uma peça sob sua direção foi forte e pensei 'quero que esse cara dirija uma peça minha um dia'. Quando o conheci percebi que, além de inteligência e uma observação particular sobre o fazer teatral, ele é um diretor de estilo próprio, dono de um universo particular, e isso é raro fundamento para qualquer artista.”
Vocalista da Vanguart
O músico Hélio Flanders, da banda Vanguart, recebeu o convite para fazer a trilha sonora do espetáculo. “Tinha ouvido falar muito bem do trabalho do Zé Henrique e logo que tive mais contato com suas montagens, ele é absurdo! Admiro muito o Zé, suas observações para a criação da sonoplastia serão muito importantes. O texto de Mormaço é muito instigante e já estou sentindo uma conexão forte com a trilha. A ansiedade de fazer algo inédito se mescla a uma excitação enorme e o prazer de estar trabalhando com um diretor tão talentoso”, afirma Hélio.
Na concepção da trilha sonora, Hélio Flanders pretende utilizar colagens e alguns enxertos de música clássica, além de climáticas e ambiências. Vocalista do Vanguart, Hélio Flanders continuará, no segundo semestre, com a turnê de Boa Parte de Mim Vai Embora (o álbum foi recordista de indicações ao VMB Brasil 2012) e, em outubro, entra em estúdio para gravar o terceiro álbum da banda.
Ficha Técnica:
Mormaço - Direção: Zé Henrique de Paula. Texto: Ricardo Inhan. Assistente de Direção: Thiago Vieira. Produção: Firma de Teatro. Realização: Núcleo Experimental. Elenco: Ana Elisa Mattos, Danilo Rodriguez, Edu Zenati, Gisa Araújo, Juliana Calderón, Laerte Késsimos, Rafaela Cassol, Ricardo Mancini, Simone Sallas, Stephanie Lourenço, Thiago Vieira, Tiago Real, Valmir Martins. Para maiores informações: www.nucleoexperimental.com.br

Para roteiro:

Estreia 9 de agosto, quinta-feira, no Teatro do Núcleo Experimental, na Rua Barra Funda, 637. Temporada – 9 a 27 de agosto. De sexta a segunda – sextas, sábados e segundas às 21h. Domingos às 19h. Ingresso: R$ 30,00 inteira / R$ 15,00 meia. Ingresso gratuito às sextas (sujeito à lotação da sala). Capacidade: 50 lugares. Duração: 60 minutos. Censura: 16 anos.

segunda-feira, 18 de junho de 2012


Projeto dinâmico lança desafio
de textos teatrais curtos, com
curadoria de Marici Salomão


O concurso - que acontece de junho a março de 2013 -  prevê o envio de textos de 20 minutos (de 8 mil a 12 mil caracteres, sem espaço). Aberto ao público em geral e gratuito, o Dramaturgias Urgentes envolve encontros com especialistas nos temas propostos, com criadores teatrais e leituras dramáticas.

Para o primeiro módulo, os interessados devem enviar textos sobre A Nova Classe Média Brasileira: Os Emergentes, entre 22 de junho e 2 de julho. Participam os dramaturgos Noemi Marinho, Leonardo Cortez e Alessandro Toller. O grupo de teatro convidado para as leituras dramáticas e o encontro sobre processos de trabalho com a platéia é a Companhia de Elevador Panorâmico, dirigida por Marcelo Lazzaratto.

Mais informações no www.dramaturgiasurgentes.com.br

Como instituição cultural, o CCBBCentro Cultural Banco do Brasil segue com a proposta de trabalhar com fomento da dramaturgia e formação de público para teatro, explorando sua potencialidade para debater temas contemporâneos. Nesta linha, investe em novo projeto, DRAMATURGIAS URGENTES, que teve sua semente plantada durante dez anos em atividade semelhante. Com curadoria da dramaturga e jornalista Marici Salomão e a característica de ser dinâmico, o projeto acontece  de Junho de 2012 a Março de 2013, é aberto ao público em geral, tem âmbito nacional e é gratuito. O site do projeto é www.dramaturgiasurgentes.com.br
 

O tema do primeiro módulo é A Nova Classe Média Brasileira: Os Emergentes. Abrindo o projeto, a exposição sobre o assunto será dada por Renato Ortiz dia 21 de junho, às 19h30, no CCBB. Para concorrer, os interessados podem enviar seus textos sobre o tema proposto para o site do projeto (que entra no ar no dia 11 de junho) entre 22 de junho e dia 2 de julho. Os 30 primeiros enviados receberão pareceres técnicos, depois de análise, dos dramaturgos Noemi Marinho, Leonardo Cortez e Alessandro Toller, ficando em seguida disponíveis no site.


O grupo de teatro convidado para as leituras dramáticas e para o Workshop sobre Processo Criativo com a plateia será a Companhia de Elevador Panorâmico, dirigida por Marcelo Lazzaratto dia 28 de junho, às 19h30, entrada franca. Os demais pareceristas, diretores e atores serão selecionados ao longo do desenvolvimento do projeto.
 

DRAMATURGIAS URGENTES propõe um olhar sobre a contemporaneidade do teatro brasileiro, incluindo um Concurso de Dramaturgia, com foco em assuntos atuais do País. O projeto envolve atividades como Encontros com Pensadores e criadores teatrais sobre os temas propostos, além de oito Leituras Dramáticas dos textos selecionados em cada etapa do Concurso. Ao longo do projeto, 130 textos receberão os pareceres técnicos, auxiliando a formação profissional dos participantes.


Aberto às pessoas em geral, o projeto terá 4 módulos ou 4 temas e prevê o envio de textos curtos (são de 8 mil a 12 mil caracteres, sem espaço), resultando em um tempo de 20 minutos de leitura. Cada módulo contemplará 4 encontros - um com um especialista, outro com um diretor de teatro e mais dois para a realização de leituras de 3 textos dramáticos cada. Todas as atividades acontecem no CCBB de São Paulo.
 

Em cada módulo, cada um dos pareceristas lerá 10 textos e juntos os três vão selecionar os 6 melhores, de acordo com os critérios do regulamento. Ao longo do projeto, 130 textos analisados receberão os pareceres técnicos.
 

Entre os objetivos do Dramaturgias Urgentes está estimular a escrita de peças de teatro de autores brasileiros voltadas à realidade nacional. Refletir sobre os problemas e as questões urgentes da sociedade brasileira e do mundo atual por meio da arte; aliar cultura e educação, ao propor a produção de pareceres técnicos sobre os textos criados para os autores brasileiros, que pouco têm acesso ao estudo da dramaturgia (e isso feito por dramaturgos renomados) também está entre as propostas.
 

Também estão entre os objetivos: divulgar a dramaturgia brasileira de autores jovens e veteranos; promover a interação entre público e plateia, a partir dos processos de trabalho dos artistas brasileiros; promover a interação entre público e plateia, a partir dos processos de trabalho dos artistas brasileiros, tão caros hoje ao teatro brasileiro, pela inventividade e sofisticação de técnicas.


Classificação indicativa: A participação no concurso é para maiores de 18 anos. A participação dos encontros com especialistas é livre. A participação dos encontros com atores é livre. As leituras dramáticas: a definir. Todas as atividades serão gratuitas.
 

Para Marici Salomão, Dramaturgias Urgentes “é um projeto de fôlego, composto por um concurso nacional temático de textos dramatúrgicos, encontros de especialistas e companhias de teatro com o público, e por leituras dramáticas públicas das peças selecionadas por uma comissão de dramaturgos, que emitirão pareceres aos textos inscritos”.
 

De acordo com a curadora, “é uma novidade, para um concurso de dramaturgia, oferecer ao autor brasileiro, de qualquer região do país, um parecer técnico sobre o que escreveu. É um grande diferencial. Aliás, este projeto tem alguns diferenciais: o fato de uma companhia apresentar seus processos de trabalho ao público, convidando-o à participação, é algo que ainda pouco acontece. Também na ponta final do projeto 2012, há o empenho desta equipe de trabalho de querer ver montado o melhor texto do ano de 2012. Enfim, é um projeto que pretende não só estimular a criação de novas peças – a partir de uma reflexão temática sobre assuntos que pautam o nosso dia a dia -, como provocar formas potentes de interação entre artistas de teatro e espectadores”. 
 

Marici Salomão, responsável pela curadoria e coordenação artística, explica “que a curadoria  define a linha de pensamento do projeto, detalha conceitos, desdobra ideias e pensa nos melhores nomes para compor as atividades. A coordenação artística auxilia a produção na execução das várias etapas de organização dessas atividades todas”.
 

Sobre a importância do projeto, Marcos Mantoan, gerente do CCBB-SP,  afirma que “desde 2002, com a criação do projeto Dramaturgias, o CCBB SP se debruça sobre a dramaturgia e sua relação com os criadores teatrais e o público em geral”. Para ele, “pensar o teatro hoje é também refletir sobre seu potencial de abordar as questões contemporâneas - e urgentes - da nossa sociedade. Um programa regular e anual potencializa as reflexões ao se tornar um processo, onde dialogam os artistas, os pensadores e público. A possibilidade de interação, seja no concurso de textos curtos, nos encontros ou nas leituras, pode transformar as partes envolvidas e materializar ao público o fazer teatral como um processo em construção, cheio de conflitos, angústias e esperanças”.
 

A respeito do conceito do concurso - baseado em temas palpitantes, textos curtos que traduzam a velocidade do mundo moderno e rapidez no envio -, a velocidade muitas vezes se confunde com superficialidade. Será que necessariamente? O que está por trás de tanta informação? O CCBB acredita que a reflexão é o meio mais eficaz de se relacionar com a contemporaneidade. O programa pretende utilizar a velocidade de nosso tempo, assim como nossas urgências cotidianas, em prol da interatividade, da sensibilidade e do debate. E tudo convergindo para a formação de novas plateias para o teatro.


1º Módulo – A Nova Classe Média Brasileira: Os Emergentes

a. Lança-se o tema e realiza-se a 1a. palestra dia 21 de junho, às 19h30, com Renato Ortiz.

b. encontro com atores e diretores com Cia Elevador de Teatro Panorâmico , com direção de Marcelo Lazzaratto – 28 de junho, às 19h30.

c. leitura de 3 textos – * 19/7

d. leitura de 3 textos – * 26/7
 

*nas duas últimas quintas-feiras de julho


2º Módulo – a ser definido

a. Lança-se o tema e realiza-se a 2a. palestra com especialista da área - dia 23 de agosto

b. encontro com atores e diretores – dia 30/8

c. leitura de 3 textos – 20/9

d. leitura de 3 textos – 27/0


 3º Módulo – a ser definido

a. Lança-se o tema e realiza-se a 3a. palestra com especialista da área - dia 18 de outubro

b. encontro com atores e diretores – 25/10

c. leitura de 3 textos – 22/11

d. leitura de 3 textos – 29/11



4º Módulo – a ser definido

1. Lança-se o tema e realiza-se a 4a. palestra com especialista da área - dia 17 de janeiro de 2013

b. encontro com atores e diretores – 31 de janeiro de 2013

c. leitura de 3 textos – 21/2/13

d. leitura de 3 textos – 28/2/2013



MARÇO de 2013 Divulgação dos vencedores
 

Para roteiro:
DRAMATURGIAS URGENTES no CCBB SP – 1º módulo
Exposição sobre o tema com Renato Ortiz
Dia 21 de junho, quinta-feira, às 19h30. Grátis.

Workshop sobre Processo Criativo
Companhia de Elevador Panorâmico dirigida por Marcelo Lazaratto –
Dia 28 de junho, às 19h30. Grátis.

Leituras Dramáticas dos textos selecionados
Companhia de Elevador Panorâmico dirigida por Marcelo Lazaratto –
Dias 19 e 27 de julho, às 19h30. Grátis.

Centro Cultural Banco do Brasil -
Rua Álvares Penteado, 112 – Centro – SP
Próximo às estações Sé e São Bento do Metrô

Informações: (11) 3113-3651 / 3113-3652.