terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Duas que vale conferir


Por Maria Lúcia Candeias
Doutora em teatro pela USP
Livre Docente pela Unicamp

A Cia de Teatro Encena vinha apresentando sempre montagens com textos experimentais, colocando o ponto de vista dos jovens de agora em contraposição à visão dos atuais coroas. Desta vez mudou de foco encenando ninguém menos que Jorge de Andrade, autor paulista, que, em “Os Ossos do Barão”, analisa os efeitos da crise de 29, que empobreceu os donos de fazenda e de cujos efeitos foi possível se salvar graças ao café e à imigração italiana.

Dois interesses a princípio antagônicos, mas que acabam se compondo como é hábito em nosso país pouco afeito a guerras, apesar de ter participado de algumas e criado revoluções mais ou menos localizadas. Talvez esse seja o foco que o grupo defende e enfatiza, pois é com o qual conta com a empatia da platéia. Há interesse do público do começo ao fim, inclusive rindo nas partes cômicas.

Pessoas acostumadas a assistir famílias de alta estirpe em cena, provavelmente estranharão a simplicidade de cenário (Jorge Jacques) e figurinos (Walter Lins), os quais muitas vezes parecem mais próximos do experimentalismo que até hoje caracterizou o grupo. São detalhes que não impedem a apreciação da obra, mas podem chamar a atenção de espectadores muito exigentes.

O elenco, composto por dez atores, não é inteiramente regular, mas dá conta do recado, especialmente na primeira parte, tendo como destaque Orias Elias - que também assina a direção do espetáculo - no papel do fazendeiro. Uma peça bastante otimista em contraste com tantas pessimistas, a maior parte das quais vindas de fora. Além do que trás para a cena uma das obras primas da dramaturgia paulista. Vale conferir.

Na corrente oposta está Roberto Lage que reestreou “Teatro Para Pássaros” no Teatro Sérgio Cardoso, desta vez fazendo montagem experimental. O texto é de Daniel Veronese, um dos argentinos mais premiados em seu país, já conhecido nas Américas e que nunca tinha sido montado por aqui.

É um espetáculo extremamente instigante: a primeira impressão é de que se trata de uma peça do absurdo, mas com uma característica nova, apresentando o absurdo que sempre se caracterizou pela falência da razão nas relações afetivas. A segunda impressão é a de que é de um autor que considera a juventude absurda. A terceira é a de que se trata de uma crítica à juventude brasileira, pois o país é muitas vezes citado nominalmente. Será?

Vale assistir porque mexe com a gente e o elenco (Ana Fuser, Bete Correia, Daniel Gaggini, Flávia Tonalesi , Luciana Rossi e Mário Condor) é maravilhoso, a direção com ritmo impecável de Lage, assim como ótimos cenário (Rodrigo Paz) e figurinos (Ed Mendes e Luiz Parisi).

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