Sacanagem do Michael Jackson morrer assim. Acho que ele até já vinha me avisando devagarinho que ia morrer, mas morrer mesmo, assim, deixando minha adolescência órfã? Sinceramente, eu acho sacanagem. Super da minha geração. Não deveria ser assim.
Ainda tenho os long plays (para quem não sabe, LP, filho do 78 rotações e pai do CD, deve ter tido alguma coisa aí no meio) da Família Jackson Five,Thriller, Bad... Já perdi ídolos. Muitos... mas quando Elis morreu, eu era completamente adolescente e me dividia entre o Trem Azul, querendo ser mais interessante do que eu realmente era, e o boy, aquele BAD, que hoje se foi.
Quando Cazuza morreu, eu era tão pós-adolescente quanto ele. Chorei, mas era de igual para igual. Os mesmos medos, os mesmos segredos de liquidificador, sem nunca ter entendido quais eram os segredos de liquidificador. Só para citar alguns ídolos que me deixaram à deriva.
Agora, o que faço quando constado que o tempo é implacável porque Michael, que me acompanhou da infância à vida pra lá de adulta, esfrega na minha cara que o tempo faz os dias voarem e que tenho que me cuidar, porque senão a Velha Senhora acorda.
Amanhã vou ligar pra minha turma lá do colégio. Eles vão me entender, porque devem estar lá, congelados no tempo, dançando Bem, sem ter noção de que um dia o cantor-mirim-prodígio-negro não só deixaria de ser negro como morreu branco. E qual a graça, qual a vantagem? Por quê? Pra quem? Será que não tinha ninguém muito próximo pra dizer que ele era amado incondicionalmente, independente da cor, credo, raça? Que era amado porque era um ídolo, acima de tudo, acima dos horrores cometidos contra pequenos anjos, com pais não tão anjos assim. Ah, quem sou eu pra julgar a conduta humana. Não estou aqui por isso, estou aqui pra dizer que descobri hoje, vejam só, justo hoje, que sou falível, que não sou imune à morte. Só que corro mais, muito mais rápido que a Velha Senhora e ela vai ter que suar muito pra me fazer participar de Thriller.
Vá em Paz, rapaz, que tantas alegrias me trouxe em baladas inconsequentes. Obrigada por entreter-me numa época em que, se eu tivesse escolhido seguir os passos de outros ídolos que me fascinavam pela contundência das letras e do pesar da história, como Janis Joplin, Jimi Hendrix, eu talvez não estivesse aqui hoje celebrando sua vida e chorando sua morte. Vá em Paz. John Lennon vai estar esperando você, com flores nas mãos, devolver pra ele os direitos autorais de Let it be.
Ah, por favor Michael, dê um abraço bem apertado na Farrah Fawcett, a Deusa Loira das Panteras que se foi num dia ruim, pois até nas minhas linhas dei menos pra ela. A vocês, amigos queridos, um abraço em cada um e obrigada por aguentarem firmes.
Sempre, Forte.
(Célia Forte - Na Carona do Dudu)
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A breve vida dos ícones do rock
Célia, my love, nossa geração viu muitos de seus ídolos desaparecerem cedo demais, deixando um rombo em corações e mentes. Suicidaram-se, morreram de Aids, de overdose, assassinados, loucos com a barra pesada do sucesso. Lembro do baque quando recebi a notícia de John Lennon, morto quando eu tinha 20 anos e trabalhava no Canja, jornal de música de Sergio de Souza e José Trajano. Olhei pro céu, a perna bambeou, passou um tempo até conseguir entrar na redação.
Na época da Elis Regina, trabalhava na Rádio Mulher, fiquei com o ouvido grudado no rádio para saber de todos os detalhes. A maior cantora do País também não agüentou a pressão e cheirou todas numa noite só. Outro golpe foi quando Cazuza se foi, em 1990, quando eu já estava entrando nos 30. Recebi a notícia pelo jornal da TV, no Rio, soco no estômago. Os outros golpes foram Renato Russo, que partiria seis anos depois, e Cássia Eller, em 2002. Não dá pra esquecer do Raul Seixas, que até hoje tem uma das mais apaixonadas legiões de fãs do país. Era alcoólatra e morreu em decorrência dessa doença, agravada pela diabete, em 1989, aos 44 anos.
Antes, outros "heróis", para usar palavras que Cazuza gostava, já tinham pegado o bilhete azul - Jim Morison, líder do The Doors, morreu na década de 70. Na virada dos anos 70 para os 80, outros artistas encerraram bruscamente suas carreiras - o baixista do Sex Pistols, Sid Vicious, não pegou a onda e embarcou numa overdose de heroína em Nova York aos 21. Um ano depois, em 1980, o baterista do Led Zeppelin, John Bonhan, foi encontrado morto aos 32 anos. Kurt Cobain, líder do Nirvana, grupo de vida curta mas importantes na história do rock, se matou em abril de 1994.
Voltando a Michael Jackson, quando ele cantava Ben eu ainda não tinha sofrido sequer uma dor de amor e cabulava aula pela rua Pamplona, com aquela saia xadrez, uniforme do Colégio Assunção. Ele acompanhou minha adolescência e juventude. Fui vê-lo no Morumbi, em 1993, megashow, megahisteria no estádio para ver Maicô.
Escândalos, álcool, drogas e sexo na era da Aids sempre andaram de mãos dadas com o rock'n'roll. Para alguns, o doce gosto da transgressão era mais ácido que usar um macacão de jeans surrado e fumar um cigarrinho escondido na lanchonete da esquina. Viver intensa e freneticamente e morrer jovem. Será esta a máxima de ícones do pop ou do rock?
(Fernanda Teixeira)